segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

O Conceito de Regulação


Pela sua importância e pela sua atual difusão no domínio educativo torna-se pertinente conhecer o conceito de regulação sob várias perspetivas.

Começando com os teóricos da Escola da Regulação francesa (Robert Boyer e Michel Aglietta) e baseado no conceito da regulação económica, pode definir-se o modo de regulação como um conjunto de atividades, tendentes à estabilização e institucionalização, temporárias, dinâmicas, mas prolongadas, orientadas para produzir uma congruência de comportamentos individuais e coletivos, para mediar os conflitos sociais e para limitar as distorções, produzidas pelo processo de acumulação, a níveis compatíveis com a coesão social.

Ainda neste contexto, para Roger Dale (1997a, p.277), a regulação designa as atividades de controlo, ou seja, atividades de definição do enquadramento para o fornecimento dos serviços educativos que o Estado assume através de políticas e sanções legais. A regulação implica, assim, a definição de padrões e regras que constituem o quadro em que as instituições operam.

No entanto, Dale (2005, p.67) tem argumentado que o Estado não reteve o controlo da regulação, mas constituiu-se como “regulador de último recurso”, isto é, mantém “a autoridade” e “a responsabilidade” pela governação da educação, embora não controle o modo como são coordenadas as atividades que aquela envolve. 

A atual difusão do termo “regulação”, no domínio educativo, está associada ao objetivo de consagrar, simbolicamente, um outro estatuto à intervenção do Estado na condução das políticas públicas.

O “novo” papel regulador do Estado serve para demarcar as propostas de “modernização” da administração pública das práticas tradicionais de controlo burocrático pelas normas e regulamentos da intervenção estatal.

Neste sentido, a “regulação” (mais flexível na definição dos processos e rígida na avaliação da eficiência e eficácia dos resultados) seria o oposto da “regulamentação” (centrada na definição e controlo a priori dos procedimentos e relativamente indiferente às questões da qualidade e eficácia dos resultados).

Apesar de amplamente divulgada, esta distinção não é rigorosa e não traduz o significado original do termo regulação.

A regulação enquanto ato de regular significa o modo como se ajusta a ação (mecânica, biológica ou social) a determinadas finalidades, traduzidas sob a forma de regras e normas previamente definidas.
Neste sentido, a diferença entre regulação e regulamentação não tem que ver com a sua finalidade, mas com o facto de a regulamentação ser um caso particular de regulação, uma vez que as regras estão, neste caso, codificadas (fixadas) sob a forma de regulamentos, acabando, muitas vezes, por terem um valor em si mesmas, independente do seu uso.

Ainda sobre a regulação e se tomarmos em consideração os trabalhos de Reynaud (1997 e 2003) é possível identificar três dimensões complementares do processo de regulação dos sistemas sociais:

1 - a regulação institucional, normativa e de controlo, que pode ser definida como “o conjunto de ações decididas e executadas por uma instância (governo, hierarquia de uma organização) para orientar as ações e as interações dos atores sobre os quais detém uma certa autoridade” (Maroy e Dupriez, 2000). Esta definição põe em evidência, no conceito de regulação, as dimensões de coordenação, controlo e influência exercidas pelos detentores de uma autoridade legítima, sendo por isso próxima da aceção que prevalece na literatura americana (no domínio da economia, mas também da educação) enquanto intervenção das autoridades públicas para introduzir “regras” e “constrangimentos” no mercado ou na ação social;
2 - a regulação situacional, ativa e autónoma, trata-se de um processo ativo de produção de “regras de jogo” (Reynaud, 1997) que compreende não só a definição de regras (normas, injunções, constrangimentos etc.) que orientam o funcionamento do sistema, mas também o seu (re)ajustamento provocado pela diversidade de estratégias e ações dos vários atores, em função dessas mesmas regras. De acordo com esta abordagem, num sistema social complexo (como é o sistema educativo) existe uma pluralidade de fontes, de finalidades e modalidades de regulação, em função da diversidade dos atores envolvidos, das suas posições, dos seus interesses e estratégias (Barroso, 2000); 
3 - a “regulação conjunta” significa a interação entre a regulação de controlo e a regulação autônoma, tendo em vista a produção de regras comuns (Reynaud, 2003).

Segundo Barroso (2003), num sistema social complexo, como é o sistema educativo, existe uma pluralidade de fontes, finalidades e modalidades de regulação em função da diversidade dos atores implicados, tendo em conta as suas posições, os seus interesses e as suas estratégias. Dessa forma, “a coordenação, o equilíbrio ou transformação do funcionamento do sistema educativo resultam antes da interação dos múltiplos dispositivos reguladores” (Barroso, 2003, p.10).
Este autor distingue três modalidades de regulação baseadas em alianças distintas entre atores decisivos no campo educativo:

- uma regulação burocrática, edificada ao longo do processo de desenvolvimento dos sistemas educativos e que corresponderia a uma aliança entre o Estado e os professores;
- uma regulação baseada no mercado, visível em muitos países, sobretudo anglófonos, a partir dos anos oitenta e que envolveria uma aliança do Estado com os pais, sobretudo da classe média;
- uma regulação baseada na comunidade, ensaiada em processos desenvolvidos ao nível local, por exemplo em Portugal nos últimos anos, e que seria sustentada por alianças entre os professores e famílias.

Assim, a regulação no campo da educação pode ser considerada como:

(i) Um conjunto de mecanismos postos em ação para produzir a congruência dos comportamentos, individuais e coletivos, e mediar os conflitos sociais, bem como limitar as distorções que possam ameaçar a coesão social, incluindo, em particular;

(ii) a definição de padrões e regras que estabelecem o quadro para o funcionamento das instituições.

A diversidade de fontes e de modos de regulação faz com que a coordenação, o equilíbrio ou a transformação do funcionamento do sistema educativo resultem mais da interação dos vários dispositivos reguladores do que da aplicação linear de normas, regras e orientações vindas do poder político.

BIBLIOGRAFIA:

BARROSO, J. (2005), Políticas Educativas e Organização Escolar. Lisboa: Universidade Aberta.
BARROSO, J. (2005), "O Estado, a Educação e a Regulação da Políticas Públicas", in Educ. Soc., Campinas, vol.26, n.92, pp.725-751, especial outubro.
DALE, Roger (1997a), “The State and the Governance of Education: An Analysis of the Restructuring of the State-education Relationship”, in A. H. Halsey, Hugh Lauder, Phillipe Brown, Anne S. Wells (orgs), Education – Culture, Economy and Society. New York: Oxford University Press, 273282.
DALE, Roger (2005), “A globalização e a reavaliação da governação educacional. Um caso de ectopia sociológica”, in António Teodoro, Carlos Alberto Torres (orgs.), Educação crítica e utopia. perspetivas para o século XXI. Porto: Afrontamento, 53-69.
 ● http://pt.wikipedia.org/wiki/Escola_da_regula%C3%A7%C3%A3o


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